A Carência[i] faz relações, porque é a falta de um buscando o melhor do outro que o busca pelo mesmo motivo.
No entanto, a crença de que a carência é o motivo de todas as escolhas erradas, e até do abuso, tem culpabilizado a vítima e defendido o agressor.
Pode ser que uma criança que tenha sido abusada, emocionalmente e/ou fisicamente na infância, se relacione com um tipo abusador na vida adulta. Mas isso não tem nada a ver com a sua carência.
Tem a ver com o paradigma de relações que viveu e a falta de noção de que existem outras formas de se relacionar, até a sua dor buscar uma terapia.
Pode ser que uma pessoa muito bem tratada na infância também se relacione com um abusador na vida adulta. E isso não tem nada a ver com a sua carência, que também existe. Tem a ver com a falta de noção de que existem abusadores no mundo e de que todos nós, um dia, podemos ter contato com eles.
Portanto, se culpar achando que a sua carência a levou ao abusador é a mesma coisa que culpar a minissaia e não o agressor. É deslocar a responsabilidade da ação abusiva para a vítima.
O abuso nunca precisou da carência, nem da autoestima baixa, para acontecer. Só precisa do abusador e condições sociais que o viabilizem, como o machismo, o racismo e a aporofobia (aversão aos pobres), por exemplo.
Estas
falas de influenciadores homens, que apontam a carência da mulher como o
problema da “atração” por homens abusivos é mais uma exploração da
mulher. Porque não toca no problema. Se alimenta dele.
Porque
não mostra que a maior rede de apoio existente, o tecido social, é feito de
trocas, graças às carências e competências (e outros atributos).
Assim
a rede de sociabilidade feita de dependências sadias é sistematicamente
rompida, ao atacarem o que a possibilita. E todas as cobranças advindas
deste erro, recaem mais uma vez sobre uma mulher. A mãe[ii].
Todos
os problemas de ordem social que criam abusadores, de repente vão para a conta
da mãe dos abusados, com diagnósticos perversos sobre ela. Uma mulher, segundo
esta lógica perversa, errada por natureza.
E o ciclo de abusos reinicia.
[i] E por mais que existam vários níveis e tipos de carência, elas tampouco são a porta de entrada dos abusos, mas o desconhecimento da anatomia deles sim.
[ii] Por exemplo: “Mãe narcisista”
Existem pessoas narcisistas, de fato. No entanto, quando se coloca “mãe” na frente do diagnóstico, o recorte machista da anamnese está dado.Ou mesmo quando se coloca “pai” na frente do diagnóstico “narcisista”. Afinal, as pessoas não precisam estar no papel de pai, nem mãe, para serem narcisistas.
Ao colocarem o papel social delas na frente do diagnóstico, um julgamento moral, cheio de ideais de perfeição, começa a mediar a relação que se buscava curar.
E o que esta pessoa rotulada de mãe narcisista faz?
Não dá conta das necessidades dos filhos porque está tentando dar conta dela, sem saber como se faz isso num mundo onde a mulher é considerada culpada de tudo. Principalmente culpada por sua carência, compreendida pejorativamente como narcisista ou como a causa de todo abuso sofrido.
No google:
Pai
Narcisista - Aproximadamente 364.000 resultados
Mãe
Narcisista - Aproximadamente 394.000 resultados
Mônica Clemente (Manika)
@manika_constelandocomafonte
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