Há algum tempo, entramos, eu e o
grupo, em uma Constelação[i].
Eu estava como facilitadora. A pessoa estava envolvida amorosamente com alguém
que já não estava mais interessada nela como antes, querendo terminar a relação.
Os representantes foram escolhidos intuitivamente.
O “constelando/a” e o “novo
parceiro/a” se colocaram no centro do palco, se deixando guiar pelos movimentos
que sentiam, lentamente. Perguntei depois de muito tempo o que o representante
que estava fazendo o constelando sentia:
- Eu gosto do meu parceiro/a, de verdade, mas
não consigo ir para ele/a, algo me prende.
O representante do novo parceiro/a disse que não conseguia ver a outra pessoa
(o representante do constelando).
- Não vejo ninguém ali. Quero partir.
O constelando me disse, então, que teve um
relacionamento antigo que o marcou muito. Colocamos um representante para este “parceiro
anterior”.
Quando ele/a entrou, o representante do
constelando começou a chorar. Disse que ainda o amava muito, muito, mesmo
aceitando o fim da relação. Fizeram alguns movimentos que o Campo sugeria, e, por
mais que o representante do constelando estivesse mais aliviado com a presença
e reconhecimento do amor que sentia pelo “antigo parceiro/a”, ele não conseguia se mover. E o novo
parceiro ainda não o enxergava.
De repente, o representante do constelando,
ao se deixar levar pelo Campo sem tentar influencia-lo - e isto é uma das grandes
novidades e efeitos profundos da Constelação [ii]
– falou olhando para o representante do antigo parceiro:
- Eu te amo, eu ainda te amo, amo, amo muito.
Ele/a não só reconheceu o amor que tinha, e
estava preso em sua garganta depois da rejeição que sofrera, como falou isso olhando
nos olhos dele.
A medida que fazia isso o representante do
novo parceiro/a, começou a enxergá-lo. Já não sabia se
queria ir embora como antes. E mesmo vendo que ele/a gostava do antigo parceiro, se encheu de
coragem de estar com aquela pessoa.
Se estivéssemos fora do Campo, talvez
pensássemos que o amor de um parceiro por outra pessoa iria nos afastar dele. Mas
vivenciando o Campo aprendemos outras coisas: 1) o que é nosso tem força, nos
enriquece, nos faz aparecer! 2) e isto atraiu o novo parceiro, ao contrário do
que se poderia imaginar. Por isso, o próprio Hellinger se diz professor de uma
filosofia prática com as Constelações Familiares, porque se aprende algo
experimentando o Campo, algo que vai além das racionalizações e intenções.
Coloquei o constelando em seu lugar na
Constelação. Ele iria “vivenciar a si mesmo” na profundidade que surgia. O
representante saiu, sabendo que havia recebido algo também. O constelando
sentiu o amor enorme que tinha pelo antigo parceiro e, à medida que aceitava e
falava isso, se preenchia com todas as suas riquezas. O antigo amor era sua
fortuna também. Por que apagá-la, negligenciá-la? Ele/a começou a sentir que
podia seguir em frente, ir até o novo parceiro/a, devagar. O passado o
assombrava porque foi negado. Agora era potência. O representante do novo
parceiro continuava com seus olhos brilhando para o constelando porque agora tinha
alguém de verdade lá.
Nos foi revelado[iii],
sem ninguém dizer nada, que o constelando ao tentar esquecer e apagar o antigo
amor, porque a separação doeu demais, acabou apagando-se e desaparecendo
também. Como constelação não é previsão,
mas um mergulho na verdade que se apresenta, não sabemos se a nova relação vai
continuar, mas que o novo movimento vai atuar durante algum tempo.
Quer dizer, os novos começos ganham energia se
levam junto tudo o que se têm. O amor pelo(s) antigo(s) parceiro(s), afinal,
não impede alguém de recomeçar e seguir adiante, pelo contrário, vira o
combustível para isso, porque na verdade, é a imensa capacidade de ser e amar.
[i]
Troquei detalhes para
salvaguardar o entorno afetivo do que aconteceu.
[ii] Uma das grandes novidades da
Constelação Familiar, e o seu risco, é que o Campo por onde ela navega é que
traz a solução. Assim, não há uma fórmula pré-estabelecida, ou um desfecho igual
para todas as dinâmicas. Pode-se ler todos os livros do Hellinger e
colaboradores, ir aos seus seminários transformadores, onde entramos em camadas
mais profundas do Campo – uma inteligência que armazena afetos transgeracionais
e traz as soluções -, mas só a sua Constelação trará a sua resposta, a sua saída.
A Nova Constelação já nos faz
constelar em conjunto: a saída de alguém pode ser a saída de todos. Mas ainda
assim, só na hora da constelação é que ela se revela e age em todos. Por isso o
risco de “não saber”, de apenas deixar o Campo nos conduzir, sem que tenhamos
controle, até o alívio.
[iii]
A verdade na constelação é uma revelação que surge e desaparece. A vivência
dela transforma a todos.