Não fale mal da carência
Mônica Clemente (Manika)
Não Fale mal da carência. Ela é como uma curva, cheia de faltas, de uma
pecinha de quebra-cabeça, aguardando o excesso de outra pecinha que também tem
um vão.
Sem ela não haveria relação, nem o mar, nem os rios,
nem as estrelas preenchendo vazios.
Por isso, fazer psicanálise é tão
difícil. Além de nos vincularmos onde sentimos fraqueza, abrimos mão do
controle para desvendar nossa escuridão.
O problema, então, nunca foi a carência, mas querer
preencher seu vazio com coisas ou pessoas que não querem, não podem, ou não tem
o que dar.
Quem faz isso é uma saliência insistindo em beber
água onde se colheria flores.
Um filho, por exemplo, não pode dar um esposo, um
pai, uma mãe, um guia moral ou espiritual para seus próprios pais. Ele só pode
dar um filho, se ficar neste lugar na relação com eles.
Os pais podem experimentar isso se ficarem como
pais, na relação com seu filho/a.
Portanto, existe uma falta em todo mundo que é um
encaixe para o excesso de outra pessoa, mas não a qualquer preço.
A mim, por exemplo, falta um lado masculino. Isso
garante que um homem de carne e osso possa ocupar seu lugar ao meu lado.
E com feminino eu quero dizer que quero experimentar
o mundo com este princípio, sendo eu tudo aquilo que posso e quero ser e
fazer.
Também me faltam vocações, risos e compreensões que
outros têm para trocar comigo.
Como dizia Jung:
“Um
relacionamento humano não se baseia na diferenciação e na perfeição, pois estas
apenas enfatizam as diferenças ou trazem à tona o oposto exato: ele se baseia,
isto sim, na imperfeição, naquilo que é fraco, indefeso e carente de apoio — a
própria origem e razão da dependência.
A
perfeição não precisa dos outros, mas a fraqueza sim, pois ela procura apoio e
não enfrenta o parceiro com qualquer coisa que possa força-lo a uma posição
inferior e até mesmo humilhá-lo.” (Jung)
O universo não seria imenso se fôssemos perfeitos.
Foi a carência quem permitiu ao mar beijar o desfiladeiro.
Mônica
Clemente (Manika)
______
Na
foto sou eu no Cabo da Roca, em 2018.
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