18 de set. de 2013

33) Qual o seu roteiro de vida?



Qual o seu roteiro de vida?
Você é o autor ou somente um dos personagens?




          Qual a sua história predileta ou a que mais te impressionou até os seus sete anos? Escolha apenas uma. Pode ser uma canção, conto de fadas, etc. E nos últimos 2 anos, qual o filme,  ou romance, poema, conto, música, ópera, etc., predileto ou que mais te marcou? Novamente, escolha apenas uma, porque ela  vai te ajudar a trazer algo à luz. Consegue encontrar alguma semelhança entre o enredo da primeira narrativa com o da segunda? 


         Antes de seguir a leitura no próximo parágrafo, sugiro que, com paciência, você encontre estes dois roteiros. Compare-os. Há algo de parecido nestas duas histórias? Com qual dos personagens se identifica?

Pesquise se quiser o que interpretaram sobre eles e veja se há alguma relação com uma situação de sua vida e história familiar dos seus pais, irmãos dos pais, avós ou bisavós maternos e paternos. Este processo revela para quem olhamos, com quem estamos identificados, com qual destino estamos entrelaçados sem saber, nos dando opção de reformulá-lo. Como? Olhando com carinho para o enredo e incluindo a todos.

Observe também em seu entorno os diversos roteiros representados: algum é parecido com Jonas, Orfeu, Dionísio, com Ofélia de Hamlet, a Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Orestes ou com os escafrandos sedentos de amor de Chico Buarque?

Este exercício ajuda a revelar os scripts (roteiros) encenados por nós apontando destinos em ressonância com histórias familiares, muitas vezes desconhecidas.

É verdade que Bert e Sophie Hellinger já foram além dos roteiros nas constelações das famílias, nos apresentando soluções e posturas de humildade diante de um Campo Maior, mas ainda assim os scripts revelam situações, descortinando enredos e soluções durante a observação do Movimento do Amor numa Constelação. Isto é, para onde nos movemos motivados pelo “amor cego” ou pelo “amor que enxerga” reproduzindo destinos de antepassados sem nem saber.

O amor cego é aquele que não olha nos olhos daquele que segue e assim repete o mesmo destino, recriando a mesma sina para incluir quem não é visto. “Olhem para esta pessoa que viveu o que vivo agora!”

Esta atitude gera mais dor no sistema. O amor que enxerga, olha nos olhos e por isso é incapaz de repetir o enredo, porque não quer colocar mais uma pedra em cima da dor do seu parente esquecido. Basta imaginar aquele que é seguido vendo algum descendente recriar a sua dor. Como ele/a se sentirá, honrado ou como a causa da repetição do sofrimento? O que traz paz a ele/a, a repetição da sua “tragédia” ou novos destinos e soluções?

Quantos finais um mesmo roteiro pode ter? Não é melhor criar sua vida sem roteiro pré-definidos? Qual a melhor saída para você? Como ser autor de seu próprio roteiro de vida? Há quem trabalhe com scripts e mitos e, por meio deles, escreve soluções surpreendentes com destinos mais felizes. Segundo Hellinger e o Tantra Yoga proposto pelo filósofo Sarkar, a tendência nos movimentos da vida é o crescimento da felicidade e a finalização da infelicidade, por isso estamos sempre buscamos outras soluções quando procuramos ajuda ou um caminho espiritual. E o espaço criado na relação com o outro em uma terapia é um dos  terrenos férteis para a cura acontecer.

Quando se vai a uma constelação familiar, mesmo que não se constele um tema pessoal (sempre constelamos se estivermos no processo como observador, participante, constelando, não há diferença nenhuma), nosso próprio roteiro é revelado de alguma maneira nas dinâmicas familiares que vêm à luz, pelos sentimentos que sentimos, assim como um movimento em direção à felicidade começa a acontecer conscientemente.

Por isso, com relação ao trabalho com roteiros, Hellinger é literal, ou seja, ao pegar o enunciado de um conto, por exemplo, o “O Lobo e os 7 cabritinhos” a mãe diz: “não deixem seu pai entrar”.  O Lobo representa um pai ou avô, ou bisavô excluído pela mãe e os cabritinhos representam os seus filhos. Seja lá qual foi a razão da expulsão, veremos mais tarde, nas futuras gerações o desdobramento desta ação com uma neta ou bisneta casando com um “Lobo” igual ao pai, avô ou bisavô excluído para incluí-lo no sistema. Pode ser que ela também represente a mãe, avó ou bisavó, expulsando o próprio pai de casa, ou ela estará identificada com o sofrimento de um dos “cabritinhos” ao ter expulsado o próprio pai, a mando da mãe, por mais que houvesse justificativa para o ato.  

Não estamos interessados em julgar o pai, a mãe, as crianças, a expulsão ou os atos que levaram a tal dinâmica, mas em ver a repetição do roteiro e como isto afeta a pessoa, porque muitas emoções ficam no "ar" por séculos esperando ser vividas...

Aí está o roteiro montado e o adubo (emoções) ideal para escalar os atores para um determinado destino. Mas há vários desdobramentos destas identificações quando fazemos a Constelação.

De qualquer maneira, não é o enredo o foco das dinâmicas, nem o constelador se prende a isto para sentir as solução. Por isso, não é importante dizer o conto predileto quando se vai constelar, a não ser que o Constelador pergunte.  O importante do que se está falando aqui é que vivemos histórias com destinos premeditados se não conhecemos o emaranhamentos onde ficamos presos.

Óbvio que há movimentos muito maiores, que escapam ao “poderio” das escolhas. Quando pensamos na sociedade como um todo, em determinado momento da sua história vemos que seus personagens são escalados para viver algo que escapa ao controle, como multidão e não como indivíduo. Qual será a dimensão desta experiência coletiva para a expansão da alma?

A humildade, o extraordinário... ?

No livro “Ah, que bom que eu sei. A visão sistêmica nos contos de fadas” de Brigitte Gross e Jakob Schneider (Atman, 2005), as repetições de destino, por meio da escolha dos episódios literários significativos num roteiro de vida são amplamente demonstrados e depois solucionados em Constelações Familiares.  

No conto “A bela adormecida” é constelado o roteiro da “mulher abandonada”:  a 13ª  fada não é convidada à festa de casamento do Rei. Mais tarde, a filha do  Soberano ao chegar na puberdade – idade das iniciações nos relacionamentos amorosos - é “abatida” por um sono eterno. A fada excluída representa um/a (ou vários/as) parceiro/a da mãe ou do pai que sofreu muito com a separação e não foi reconhecido/a ou honrado/a, fazendo com que tivesse perdido sua vida já que não tem valor, como a bela adormecida. Mais tarde, alguém do sistema do pai ou da mãe que abandonou ou foi abandonada por este parceiro pode reviver este mesmo destino e ser largada sucessivamente, sem perspectivas de refazer a sua vida amorosa.

Já em a “Pequena Sereia” o roteiro é do "amor não correspondido". A “Gata Borralheira” representa alguém que "trabalha duro sem direito a prazer" - como muitas mães de hoje em dia -, ou a pessoa que escolhe este conto está identificada com umas das irmãs da Cinderela que têm destinos difíceis. Em “João Felizardo” um homem perde tudo e em “Um Alfaiate Corajoso” há um charlatão. No conto “João meu pé de Feijão” um homem entrega seus bens por uma bagatela (Gross e Schneider, 2005).

É claro que as interpretações não são tão determinantes assim. Estas informações surgiam nas falas ou posturas corporais durante as constelações e variavam. O importante é a solução, já que nunca procuramos o problema, mas a saída. Por isso, às vezes, nem entendemos o que aconteceu, mas algo se move para felicidade e mudanças surpreendentes acontecem.

Dentro desta mesma temática, fazendo uma pequena digressão, eu gosto muito de estudar as relações entre os Florais de Bach e os contos de fada, porque as flores têm histórias de vida e também gestos, danças, destinos. Eu mesma tenho feito algumas correlações ao longo dos anos de trabalho.

O Floral é um composto que capta energeticamente os hologramas das histórias das flores e pretende dar uma saída, como fez a flor, para quem entra em contato com seu mapa hologramático. O próprio Edward Bach (Barnard, 2004) relacionou o Floral Clematis, com “A Bela Adormecida”, uma vez que ele é indicado para aqueles que não sentem nenhum interesse neste mundo cheio de contradições e sem perfeição. Esta pessoa vive na Lua de mundos distantes, vislumbrando o invisível, sonhando acordada, como se quisesse morrer aos pouquinhos e reencontrar um grande amor. São pessoas que a gente chega e diz oi, e ela não nos reconhece porque o mundo real não tem o apelo do além – ou da pessoa que não está mais lá.

Esta história está  inscrita na própria maneira como a planta se organiza em seu habitat. Seu caule fraco (coluna com problemas), suas raízes escondidas, onde fica o esquecimento, sua polinização ao vento, e a postura diáfana da flor.

Muitas relações entre as flores e a postura de vida podem ser feitas, sem que isso encerre as múltiplas interpretações e possíveis reduções que possamos cometer. Julian Barnard (2004) relaciona a flor Rock Rose, indicada para o estresse daqueles que entram em pânico, com o conto da Pequena Sereia. Na constelação este enredo desemboca em um amor não correspondido. Há meses tento relacionar estas duas observações escrevendo um conto sobre isso (ainda tem um ano de trabalho pela frente para ficar pronto). Mas tenho uma hipótese: a Sereia não quer realmente encontrar uma relação amorosa porque esta gera muita angústia. 

No conto, ela briga com o pai, larga a sua vida no mar para virar humana (como fazemos na travessia de uma fase da vida para outra) e doa sua bela voz para uma feiticeira em troca da transformação da sua cauda em duas pernas.  Com isso, ela almeja buscar e entregar seu amor ao jovem que salvara do naufrágio. Imagina a dor envolvida neste processo de perder suas origens, a sua voz e enfrentar o medo da sexualidade para poder ter uma relação. 

Como ficou muda, não consegue dizer ao seu amado o que se passa em seu coração (como se a voz fosse o único recurso para conseguir se expressar).  Apesar do amor não precisar de palavras para se manifestar, a garganta e o ventre são dois centros que se fecham quando se tem medo da entrega. Conversas, inclusive, podem encobrir a verdade. A famosa DR (discutir a relação sistematicamente) pode matar um grande amor, como não falar nada, também.

Se alguém está identificado com o enredo do conto “A Sereia” pressuponho que precise, inconscientemente, atrair pessoas que não correspondam ao seu amor (ou até correspondam, mas sentem alguma barreira intransponível) para  não enfrentar a angústia apavorante do bloqueio de sua sexualidade ligada ao coração e de  sua  voz - manifestação no mundo e aceitação de sua verdade (quem ela é). Bem, esta visão está mais relacionada aos padrões pessoais do que aos movimentos sistêmicos da alma familiar, mas não se excluem porque podem ser os caminhos de energia apreendidos por meio dos enredos de gerações passadas. No entanto, se for buscar na família, encontrará alguém que teve o mesmo destino de “amor não correspondido”, e que talvez esteja ainda identificada.

A saída? Em uma constelação ela surge, não é padronizada, mas olhar para quem perdeu este amor por ajudar: “agora vejo o teu imenso amor, ele tem um lugar”.

Já a flor Centaury, minúscula e "invisível" aos olhos desatentos, está relacionada às personalidades com dificuldade de dizer "não" por conta da sua ânsia em agradar. Esta flor vista de perto se parece com um céu cheio de estrelas e é muito resistente. Ela tem afinidade com a personagem Gata borralheira/Cinderela, escravizada e sem identidade para saber quem é e qual o seu lugar.

Holly e Willow são as flores das Bruxas, seres à beira do amor universal, que ainda não conseguiram abrir mão da vingança como solução das injustiças que viveram. Não precisam perdoar, isso é arrogante. Não se perdoa uma pessoa porque não se retira dela a responsabilidade do que fez, mas deixamos com ela seus atos, e com a gente o que fizemos por conta disso. Ganha-se força, capacidade de escolha e de amar coletivamente, quando até aquele que errou, depois de compensar o seu erro positivamente, pode ter uma nova chance.

E assim sucessivamente. O que quero salientar com toda esta digressão, é que esta forma de ver o mundo, por meio de roteiros dos contos de fada ou das flores, não pretende ser determinante, mas criativa (somos co-autores) em busca de novas soluções. Histórias que caminham juntas e encontram várias saídas. E que os acontecimentos da vida parecem mais com scripts cheios de emoções e possibilidades do que com hormônios, ou com programas de computador ou com porcas e parafusos. Freud agora me diria: fale mais sobre isso.

- Sobre o quê?

- Porca e parafusos ...

Eu mudaria de assunto levando a questão para o coletivo: “Branca de neve e os Sete Anões que o digam”.

- Sete?

- Bem, a Branca sem o pai e a mãe para protegê-la, acaba cooptada junto com seus amigos num esquema forte. Mas, como não há cartéis de licitações na área do transporte em São Paulo que não sejam descobertos pelo espelho mágico da Rainha, a questão é se os “vilões” serão  descobertos, uma vez que estão no poder. A solução? Para o Brasil eu diria que é necessário cada vez mais reintegrar os excluídos, tirar os Amarildos da invisibilidade, desmilitarizar a polícia, mais política, governar para o bem comum e não para o umbigo..., entre outras coisas. 

Freud me mostraria que sou eu a filha alienada do sistema, como todos os excluídos e a Branca de Neve, e eu estaria novamente amarrada em contos de fadas buscando a  solução para os roteiros da vida.  Qual a solução?

Para cada caso uma saída que não pode ser padronizada, mas entre elas sempre tem o olhar para quem foi excluído/a, com quem se cria a identificação, reconhecê-lo/a, aceitá-lo/a e a sua história. Deixar com ele/a seu destino, com amor, humildade e gratidão. Olhar para frente e deixar o passado fazer o seu milagre, porque “liberados somos concluídos” (Hellinger).

"Somente quando a fruta madura cai à terra desprende aquilo que serve ao futuro"
Bert Hellinger


Futuros Amantes




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