JOÃO DE FERRO, BOYHOOD e CAPITÃO
FANTÁSTICO
A Jornada de Iniciação Masculina
(tem spoiler)
O texto abaixo é sobre a
jornada masculina, durante a passagem do reino da mãe para o reino do pai, segundo Robert Bly [i]
em seu livro João de Ferro, analisada nos filmes Capitão Fantástico e Boyhood.
Para os homens, de acordo com relatos de amigos meus que leram o livro de Bly
ou fazem o Movimento Guerreiros do Coração,
é uma possibilidade de acessar os arquétipos, símbolos e desafios do processo de individuação masculina. Para as
mulheres uma esperança de reencontrar seus parceiros, seus limites e sua relação com os homens.
Como toda boa obra, o
filme Capitão fantástico, dirigido e escrito por Matt Ross, tem dois temas permeando a narrativa. Um mais visível e outro subterrâneo. O roteiro enfoca a criação dos filhos contra a decadência da dessimbolização da civilização
ocidental. Uma civilização que optou por banir as trocas simbólicas [i]
que dão sentido à vida, ajudando o autoconhecimento, por trocas de mercado. E, em paralelo, revela outra
história: a jornada extraordinária de deixar de ser um menino para virar um
homem. De sair da esfera da mãe para ir para a esfera do pai.
O despertar de um homem começa cheio de potência, já na primeira
cena. E ele será desafiado até o final do filme, quando o maculino, já na esfera do pai, não perde a conexão com sua doçura e sentimentos para seguir em frente.
Em Boyhood, do maravilhoso
cineasta Richard Linklater, a trajetória de um menino até a sua juventude
termina com um horizonte um pouco vazio de sentido e muitas possibilidades a
partir desta falta. Há uma certa melancolia no céu de fim de tarde. A história
em segundo plano também fala da formação de um homem, mas no mundo
dessimbolizado. Tanto é que a mãe do protagonista, apesar de toda a sua emancipação conquistada num mundo machista de homens-crianças, também está sem os aliados simbólicos para ajudá-la a criar sentido ou passar para novas fases da sua vida.
O que faltava, propositalmente, em Boyhood, era o elo com o mundo arquetípico
masculino no protagonista e em seu pai. E o elo com o mundo feminino na mãe
dele. Ou seja, a passagem de um menino para a vida adulta na sociedade atual
(inclusive porque Boyhood foi filmado ao longo dos 12 anos da maturação do ator mirim),
está sem a potência do homem, nos papeis de pai e de marido, porque ele é ausente. O filme parece que se
passa todo naquela fase do conto João de Ferro, segundo Robert Bly, quando a bola de ouro do
príncipe fica presa da jaula do homem selvagem e não pode mais ser resgatada, a
não ser que ele busque a chave debaixo do travesseiro da rainha (mãe) e vá fazer
a sua jornada masculina.
Estas lacunas,
brilhantemente reveladas na película de Linklater, pretendem ser superadas
nos métodos de criação dos filhos do Capitão Fantástico.
Ellar Coltrane durante os doze anos de gravação do filme Boyhood
Aquele rapaz sensível e receptivo,
artista e carismático de boyhood foi lançado ao mundo sem a força do homem
selvagem, que nenhuma barba lenhador vai conseguir suprir. Talvez esta moda
seja uma esperança – que não funciona sem seu contexto simbólico e ritualístico
- de poder acessar um elo perdido com a masculinidade, que a revolução industrial
e a moral religiosa trancafiaram em seus porões.
Há, segundo Bly, 5 (cinco) aspectos da masculinidade que são representadas pelos cabelos do homem selvagem
em João de Ferro (que aparecem com força nas imagens do Capitão Fantástico).
Eles foram suprimidos na civilização ocidental de diversas maneiras. São eles, por exemplo:
1) O espírito
caçador que liga os homens aos seus ancestrais. Não adianta transpor esta faceta caçando mulheres ou virando um alpinista social. Neste estágio, o menino
quer caçar mesmo. Muitos de nós, eu inclusive, não suporta este estágio do
masculino. Mas, segundo Bly, ele surge em algum momento com estilingues e
passarinhos caídos e, depois, é integrado como uma conexão saudável com os instintos de sobrevivência.
2) Há, também, o surgimento de um
temperamento mais quente, como fogos de artifícios que, simbolicamente, lembram a energia masculinas, segundo Bly.
3) Tem a impulsividade
apaixonada, que é muitas vezes punida rigorosamente em algumas
religiões ou medicada como DDA.
4) Há a espontaneidade.
5) E há o ciúme de tigre e a força
de um leão. Todos estes “estágios” encaixotadas numa cadeira de escola que fixa
nosso olhar num quadro negro, aos cuidados de boletins enviados aos pais.
Algumas de nós, a partir dos anos
sessenta - e eu me excluo totalmente deste desejo -,
começamos a querer criar os nossos filhos homens com o lado feminino mais desenvolvido, para
contrapor aquele tipo de homem que nos reprimiu. Para que a nova geração de homens pudesse ter mais sentimentos, desconsiderando que o masculino também tem sentimentos. Nem o homem se sentiu mais integrado em seu
masculino positivo por meio desta estratégia, nem nós.
Nem o rifle dado pelo avô, no filme
Boyhood, pode fazer esta passagem do menino para o masculino adulto, porque o presente não foi dado no contexto de um ritual. Nem no contexto da convivência do garoto com o pai e o avô. Como uma arma fará a vez da presença dos homens, como pai e avô, para um menino? Talvez o prenda naquele lado sombrio da masculinidade
que torturou o planeta, dominou as mulheres e funda o imperialismo.
Os avós, ou anciãos, segundo as
antigas tradições e o Bly, são os reservatórios de sabedoria e a ligação com os
ancestrais, capazes de ajudar a tarefa de individuação. Eles e as anciãs são
desprezados em nossa época.
O próprio carro que o pai do
protagonista prometeu para ele, símbolo desta passagem da força masculina, foi
vendido numa quebra de acordo e justificativas ultrapassadas. O pai, neste filme, ainda não aprendeu nada sobre o misterioso arquétipo de ser pai e ainda joga a culpa nas esposas. A presença forte da mãe também não ajudou o protagonista nesta tarefa de virar homem, embora tenha lhe
garantido a sobrevivência e outras riquezas indispensáveis.
Quase ao final, em uma cena memorável e mínima, que rendeu um Oscar à Patrícia Arquette, a mãe que ela interpreta também
quer saber onde esteve o tempo todo em que não acessou um sentido de vida. Ela lutou para criar seus filhos. Ela lutou para achar um bom homem que nunca
encontrou. Toda esta luta sem a parceria dos mitos e seus símbolos, narrativas que fornecem pistas para o herói e a heroína não se perder de si mesma.
Ellar Coltrane e Ethan Hawke - o pai.
Ela, a mãe, também não encontrou
na cultura em que vivia um caminho para a sua feminilidade. O Feminino e o masculino
não são o fim da nossa jornada, mas um dos meios da individuação. E isto não tem a
ver com tutoriais de maquiagem e times de futebol que, dessimbolizados, não
cumprem a função de nos alçar ao nosso centro.
E por falar em todas as mães que têm
que criar seus filhos sem a presença do pai: como mulheres, temos limitações para a iniciação masculina. Por isso, o Robert Bly e o Capitão Fantástico podem nos ajudar a reconhecer estas limitações.
Capitão Fantástico é um filme sobre a iniciação do adolescente no mundo de sua masculinidade (não importa a sua orientação sexual). E sobre o que lhe foi roubado
e ainda lhe causa dores. Feridas que o empurram em busca da solução.
A primeira cena do filme, e a forma
como a câmera é usada, nos coloca dentro da selva em um ritual de iniciação
masculina. Joseph Campbell diz que os homens, a partir dos anos 1930 do século
XX, não passam mais por rituais que possam lança-los da esfera da mãe para a esfera do pai e da maturidade,
permanecendo crianças. Milhares de mulheres, descontentes com este cenário, tentaram suprir esta lacuna em vão.
Bly não só concorda com isso, como fala
claramente que o conto dos Irmãos Grimm, João de Ferro, ensina sobre a saída da
esfera da mãe para a esfera do pai, ao encontrar o Homem Selvagem por meio do
contato com anciões. Com isso, ele não diz que as mães não são necessária para seus filhos homens, ou que são culpadas de algo em relação a eles. Seu objetivo é seguir as pistas de um conto de fada que trata da transição de uma fase da vida, quando os filhos, em uma certa idade, precisam sair da esfera da mãe para ir para a esfera do pai e depois, se for homem, ir para o mundo.
Embora não seja o foco de Bly, a mulher também vai para esfera do pai e dos anciões na adolescência, mas deve retornar à esfera da mãe para depois seguir para o mundo.
Bert Hellinger, um ancião quando
descobriu as Constelações Familiares, mostra como o caminho para o pai, tanto
para os meninos como para as meninas, é uma conquista e não algo dado e fácil
de fazer como mostra o conto João de Ferro.
E digo mais, é um caminho quieto, como um novo engravidamento. O engravidamento de ficar perto do corpo/presença do pai para sinonizar com o corpo masculino, se o adolescente for menino. E perceber a diferença do corpo de um homem, como frequência mesmo, se a adolescente for uma menina.
Isso acontece no silêncio, nas atividade em conjunto com o pai ou avô, independente das conversas que se pode ter. Assim como na gestação, quando a criança se forma no ventre da mãe sem precisar de uma palavra para o milagre acontecer. A mãe não precisa falar nada para ser o icnonsciente do corpo do seu filho ou da filha. Por isso, não adianta usar a desculpa de que o pai é quieto e, portanto, difícil de estabelecer um contato verdadeiro. É ao contrário!
Difícil mesmo é sintonizar com o pai num novo engravidamento de si mesmo, deixando o jovem corpo aprender novos registros do masculino. Para isso, não há necessidade de muita conversa, mas sim convivência. Portanto, filhos e filhas, se der, procurem o seu pai como um mistério e deixem esta convivência nascer você novamente.
E pais, procurem seus filhos. O menino precisa ir para esfera do pai para acessar o masculino, mas um pai precisa dos filhos para acontecer.
Como filhos e filhas, então, deve-se descobrir como chegar no pai e construir uma relação com ele. Qual a melhor forma? Como
será este caminho? É arte pura`com ousadia. E, muitas vezes, precisa-se de ajuda de um bom
psicanalista e até da Constelação Familiar, se há muitos emaranhamentos.
Às vezes, no entanto, é impossível se aproximar do pai se ele mesmo ou a mãe atrapalham a própria vida que nos
deram. Ainda assim, não podemos excluí-lo do coração e não podemos caminhar para
ele como se fôssemos amantes, terapeutas, mãe, pai, juízes, capangas da
mãe ou vítimas vingativas. Se podemos ir até o pai é só como filhos ou
filhas. Até quando cuidamos deles ao final das suas vidas caminhamos até eles como filhos e
filhas.
É neste sentido que a não aparição da mãe em nenhuma cena do
Capitão Fantástico, a não ser na memória de seu marido, ou morta e enterrada, ou sendo um corpo disputado para o sepultamento, eleva a jornada de Bo, um dos filhos do capitão, à conclusão de sua
transformação para o homem adulto.
Na vida real, o corpo de muitas mães cria pequenas explosões de rejeição em relação à aproximação do filho, quando ele se torna adolescente. E o pai se afasta um pouco, fisiscamente, da filha nesta fase também. É um ciclo necessário para esta jornada de amadurecimneto sexual.
Portanto, o adolescente menino tem que se despedir da mãe e
ir para o pai. E isso se dá, segundo Bly, quando a mãe solta o filho, ou o
filho tem coragem de soltar a mãe. Então, um ancião leva o menino para
longe da família por um tempo, ensinando coisas de homens e também o
desafiando a ponto de machucá-lo fisicamente.
Neste filme, o avô dos seis filhos do
capitão é o pai da mãe falecida. Ele também se vê fracassado na criação da sua
filha, projetando a sua culpa no pai fantástico. Desta forma, imagina poder
ter uma nova chance ao exigir a guarda dos seus netos. Se, a princípio, ele
é o “vilão” do enredo, com o tempo se torna o catalisador do processo de
individuação do capitão, do seu neto mais velho Bo e do Rellian, o neto
mais novo.
Por meio do confronto com este
ancião, o capitão fantástico questiona pela "primeira" vez os seus métodos, às
vezes, mais radicais do que a rigidez do avô. Lembrando que radical é tudo aquilo que eu não aceito no
outro. A radicalidade, então, não está no que um pai ou mãe escolhem para os
filhos, mas de achar que ele, o capitão, na condição de pai pode emancipa-los
sem que chegue o momento de confrontar a si mesmo, seus erros e acertos, e ser
confrontado pelos filhos.
O avô também é poderoso e bem
adaptado ao mundo que o capitão tenta negar, personificando tudo o que a
família fantástica aprendeu a desprezar. Com ele, o pai encara os efeitos da
sua própria rebeldia e arrogância. Os caprichos do rebelde o prendem aquilo que
ele rejeita, assim como a arrogância quebra uma árvore ao meio. Sua família
corre o risco de se dividir, mostrando que tudo o que vem da família da mãe foi
negado e agora pede uma reparação.
As cenas em que os dois brigam me fez pensar na falta de respeito que o próprio capitão poderia
ter pelo seu pai e todo tipo de autoridade. Inclusive a sua mesma. Como é que ele, ou um pai, pode pretender
emancipar seus filhos sem prepará-los e sem soltá-los para as outras facetas e
fases da vida? O ator Viggo Mortensen, no papel de Capitão Fantástico, é tão bom que fica visível sua
infantilidade amedrontada diante dos erros que fez, revelados pelo avô
autoritário.
A bola de ouro na gaiola do João de Ferro
O elo com o Homem Selvagem perdido.
Segundo Bly, o adolescente
masculino em algum momento tem que ficar longe do pai e da mãe e para ir até os
anciões para serem iniciados. Os iniciadores sábios, então, mostram aos meninos
ou meninas que eles são mais do que ossos e sangue quando os levam para
cavalgar ou contam algum causo. Ou os colocam carimbado papeis enquanto eles/as
comandam uma empresa ou os fazem misturar tintas quando pintam a fachada de um
prédio ou uma mesinha de canto.
Meu avô materno me colocava em sua oficina
lixando madeira, enquanto fazia um escorrega para nós. E minha avó paterna
fingia que não nos via pular a janela para ir paquerar os meninos no meio da
noite. Sua cumplicidade nos dava coragem para voltar correndo se algo de errado
acontecesse. Ela não ia nos punir, nem nos dedurar por estarmos virando moças.
Estes encontros com os avós são
mostrados em Capitão Fantástico no meio de uma grande perda e disputas
ideológicas, a mesma que funda toda dinâmica bipolar. A mãe, no filme, sofria
de bipolaridade, preço pago com o primeiro parto, mas que está permeando todo o
filme quando a esfera da família da mãe rejeita os métodos do pai fantástico e
vice-versa.
A alienação parental dobrada, ou
quando o pai rejeita tudo o que vem da mãe e a mãe rejeita tudo o que vem do
pai cria esta gangorra onde a criança diante de um não pode ser o que vem do
outro, alternando seu temperamento para se adequar. Nós também quando
rejeitamos a diversidade das culturas e crenças de um povo, para impor a nossa religião e a
nossa visão de mundo nele, criamos uma cisão intransponível que só a bipolaridade
pode alcançar. Da mesma forma, ficamos em gangorras quando o feminino tenta educar o
masculino para ser homem e o masculino tenta educar o feminino para ser mulher.
A solução, no filme Capitão Fantástico, surge em algumas cenas. Em uma delas, o pai e os filhos entram pelo corredor de uma
Igreja, numa cerimônia de despedida da mãe morta, vestidos com cores alegres e
ornamentos feitos de peles e flores pelas próprias crianças. Se para o
avô, velando a sua filha, isto é uma afronta e representa o fracasso total daquele pai
vestido de “clown”, para a jornada do masculino é a chegada ao mundo dos avós,
pela porta da frente das crenças que os separaram até então.
Ainda assim, o antagonismo chega a
tal ponto que o velho acerta uma flecha bem perto do capitão, revelando que ele
mesmo, adaptado à sociedade industrial, encontrou um caminho para o masculino
dele. Que ele tem a potência anciã necessária para fazer a passagem do menino
ao homem. Ele está conectado aos ancestrais de alguma forma.
Robert Bly enfatiza mais ainda, que
não são as gangues que garantem a passagem do menino para a vida adulta de um
homem, mas o vínculo com os ancestrais. Se não são as gangues que nutrem o
nascimento do homem adulto, embora sejam necessárias quando o iniciador não
está presente, derrubar o pai para tomar uma empresa, por exemplo, é muito pior. Desafiar o
pai, ou uma pessoa mais velha como se nós fôssemos muito melhor do que eles,
então, é um corte em nossos nervos mais profundos. Como se a gente fosse
fantástica/o. Mas é verdade, os mais velhos também perderam sua conexão com esta
missão de iniciadores e enchem os netos e os mais jovens com preleções e medos
desnecessários.
Por isso, quando os filhos começam a
questionar o capitão fantástico de diversas maneiras, ele se confronta com a sua própria
arrogância e fracassos. Por exemplo, como um pai pode emancipar as filhas sem o
veículo feminino? Como foi escrito acima: o menino sai da mãe, vai para o pai e dele para os
anciões e o mundo. A menina sai da mãe, vai para o pai, retorna para a mãe e de lá segue
para as anciãs e o mundo.
Sem a mãe, resta às filhas do Capitão falar
esperanto em uma cena na qual não se sentem compreendidas pelo pai. Uma
forma delas se manterem no universo feminino sem a intrusão do princípio masculino.
Em outra cena, o filho mais novo questiona o pai e seus métodos, querendo
matá-lo e escolhendo viver com o avô materno. Esta escolha o fixa na esfera da
mãe, negando a sua própria e necessária jornada para a esfera do pai. A
presunção deste menino, que se torna melhor do que o pai para a sua mãe, só se
compara à presunção do seu próprio pai. E a mesma arrogância dos dois cede
quando o seu ferimento na alma é visto como o mesmo ferimento no pai. Diante da
doença da esposa (e mãe) eles não puderam salvá-la.
Esta impotência, segundo Hellinger, é
o que nos torna adultos, enfim. E humildes. Nosso amor não pode salvar quem a
gente ama de seus destinos e “defeitos”. Aquela visão fantástica de que
salvamos nosso pai e mãe de suas dores, colocando sobre nossos ombrinhos de
três anos de idade toda aquela dor, se desfaz quando deixamos a impotência
fazer o seu serviço. Se não deixamos ela atuar vamos enfrentar um chefe ou um
emprego que vai nos mostrar nossa impotência.
O capitão viúvo, então, diante da realização da sua impotência e dos seus
fracassos, entrega os seus filhos para o avô, o sábio ancião. Mitologicamente, é como se ele dissesse aos meninos que aceita que eles entrem no mundo do homem adulto. Pega
seu ônibus e segue a jornada sozinho. Raspa a sua barba, o cabelo original, o
que mostra a sua chegada, enfim, ao mundo dos homens maduros. Quando o homem
selvagem está integrado, os mais velhos são respeitados. Mais tarde, o filho
mais velho faz a mesma reverência numa cena simples e sem palavras. Como os
homens gostam de se comunicar.
As crianças, no entanto e apesar das
suas dores e cicatrizes, não aceitam ficar sem o pai. Elas voltam para ele
cumprindo sua missão de caminhar para o pai abrindo mão de toda a expectativa
de como ele deveria ser. Este é o caminho para o segundo pai, ou segunda mãe,
quando encontramos os verdadeiros reis e rainhas exatamente como eles são.
É quando aprendemos que não foram as
feridas criadas pelos nossos pais que nos impediram de seguir em frente. Elas
são os portais por onde acessamos os nossos gênios, talentos e força. E por onde somos iniciados. Foram as nossas expectativas
de que podia ter sido diferente que bloqueia o caminho.
Finalmente, tem a cena mais bonita do filme. E a mais triste, alegre, sensível e dura. A saída do mundo da mãe é
sempre um funeral em nossa alma e está dissolvida em nosso inconsciente
coletivo, como as cinzas espalhadas nos ralos do mundo. Ao mesmo tempo, ela está ali e é reverenciada.
Não é qualquer mãe que
liberta seus filhos de sua esfera. Nem mesmo se ela estiver morta. Mas esta mãe
garante isso em seu testamento, homenageando o ciclo da vida, como nos rituais
de ano novo. Em Capitão fantástico[i],
o filho mais velho é lançado ao mundo como homem desde a primeira cena. Depois
chega ao avô, confronta o pai, caminha para o segundo pai, se liberta da mãe
com o aval dela e parte para a sua vida - o desconhecido.
Um caminho para os anciãos também foi
criado para as filhas mais jovens, que precisarão da sua avó para fazer a sua
jornada ao feminino.
Uma mensagem importante não escapou:
não morra!
Ou como o Hellinger diz: fique vivo!
“Eu fico vivo!”
Shree Crooks em seu personagem Zaja Cash - Capitão Fantástico
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[i] Meu agradecimento ao professor Matthias Bronk que me indicou este livro quando falávamos do Capitão Fantástico.
[ii] Segundo Dany-Robert Dufour em “A arte de Reduzir as Cabeças”, as trocas deixam de ser simbólicas, carregadas de sentido, e passam a ser trocas de mercado. Tudo vira mercadoria e perde seu sentido.
[iii] No
filme é citado algumas vezes o linguista Noam Chomsky com suas posições políticas e o pediatra
Benjamim Spock, mas eu conheço muito pouco da obra deles para poder entrar a
fundo nesta discussão. Embora muito das ações do Capitão estejam alicerçadas
nestes autores.
LI.
ResponderExcluirOBRIGADA CARA MANICA, POR ATERRAR NOSSAS RAÍZES, as vezes,sem chão.
OBRIGADA por fazer compreender que sempre estamos NO PROCESSO, e então, VIVOS e ,então, cheio de possibilidades de cura. FELIZ 2018! Espero e desejo poder estar na tua frequencia e desmitificar ,pouco a pouco, a vida, que parece poder ser mais bela ainda . carinho
da gema
Oi Gema, obrigada pelo incentivo!
ExcluirPor estar aqui no blog, acompanhando! Pelos votos que recebo com carinho! Desejo a vc e sua família um 2018 maravilhoso! Beijos!