23 de abr. de 2015

45) Sobre Novos Começos


               

                Há algum tempo, entramos, eu e o grupo, em uma Constelação[i]. Eu estava como facilitadora. A pessoa estava envolvida amorosamente com alguém que já não estava mais interessada nela como antes, querendo terminar a relação.

Os representantes foram escolhidos intuitivamente. O “constelando/a” e o “novo parceiro/a” se colocaram no centro do palco, se deixando guiar pelos movimentos que sentiam, lentamente. Perguntei depois de muito tempo o que o representante que estava fazendo o constelando sentia:

- Eu gosto do meu parceiro/a, de verdade, mas não consigo ir para ele/a, algo me prende.

O representante do novo parceiro/a disse que não conseguia ver a outra pessoa (o representante do constelando).

- Não vejo ninguém ali. Quero partir.

O constelando me disse, então, que teve um relacionamento antigo que o marcou muito. Colocamos um representante para este “parceiro anterior”.

Quando ele/a entrou, o representante do constelando começou a chorar. Disse que ainda o amava muito, muito, mesmo aceitando o fim da relação. Fizeram alguns movimentos que o Campo sugeria, e, por mais que o representante do constelando estivesse mais aliviado com a presença e reconhecimento do amor que sentia pelo “antigo parceiro/a”, ele não conseguia se mover. E o novo parceiro ainda não o enxergava.

De repente, o representante do constelando, ao se deixar levar pelo Campo sem tentar influencia-lo - e isto é uma das grandes novidades e efeitos profundos da Constelação [ii] – falou olhando para o representante do antigo parceiro:

- Eu te amo, eu ainda te amo, amo, amo muito.

Ele/a não só reconheceu o amor que tinha, e estava preso em sua garganta depois da rejeição que sofrera, como falou isso olhando nos olhos dele.

A medida que fazia isso o representante do novo parceiro/a, começou a enxergá-lo. Já não sabia se queria ir embora como antes. E mesmo vendo que ele/a gostava do antigo parceiro, se encheu de coragem de estar com aquela pessoa.

Se estivéssemos fora do Campo, talvez pensássemos que o amor de um parceiro por outra pessoa iria nos afastar dele. Mas vivenciando o Campo aprendemos outras coisas: 1) o que é nosso tem força, nos enriquece, nos faz aparecer! 2) e isto atraiu o novo parceiro, ao contrário do que se poderia imaginar. Por isso, o próprio Hellinger se diz professor de uma filosofia prática com as Constelações Familiares, porque se aprende algo experimentando o Campo, algo que vai além das racionalizações e intenções.

Coloquei o constelando em seu lugar na Constelação. Ele iria “vivenciar a si mesmo” na profundidade que surgia. O representante saiu, sabendo que havia recebido algo também. O constelando sentiu o amor enorme que tinha pelo antigo parceiro e, à medida que aceitava e falava isso, se preenchia com todas as suas riquezas. O antigo amor era sua fortuna também. Por que apagá-la, negligenciá-la? Ele/a começou a sentir que podia seguir em frente, ir até o novo parceiro/a, devagar. O passado o assombrava porque foi negado. Agora era potência. O representante do novo parceiro continuava com seus olhos brilhando para o constelando porque agora tinha alguém de verdade lá.

Nos foi revelado[iii], sem ninguém dizer nada, que o constelando ao tentar esquecer e apagar o antigo amor, porque a separação doeu demais, acabou apagando-se e desaparecendo também.  Como constelação não é previsão, mas um mergulho na verdade que se apresenta, não sabemos se a nova relação vai continuar, mas que o novo movimento vai atuar durante algum tempo.

Quer dizer, os novos começos ganham energia se levam junto tudo o que se têm. O amor pelo(s) antigo(s) parceiro(s), afinal, não impede alguém de recomeçar e seguir adiante, pelo contrário, vira o combustível para isso, porque na verdade, é a imensa capacidade de ser e amar.







[i] Troquei detalhes para salvaguardar o entorno afetivo do que aconteceu.

[ii] Uma das grandes novidades da Constelação Familiar, e o seu risco, é que o Campo por onde ela navega é que traz a solução. Assim, não há uma fórmula pré-estabelecida, ou um desfecho igual para todas as dinâmicas. Pode-se ler todos os livros do Hellinger e colaboradores, ir aos seus seminários transformadores, onde entramos em camadas mais profundas do Campo – uma inteligência que armazena afetos transgeracionais e traz as soluções -, mas só a sua Constelação trará a sua resposta, a sua saída.  
A Nova Constelação já nos faz constelar em conjunto: a saída de alguém pode ser a saída de todos. Mas ainda assim, só na hora da constelação é que ela se revela e age em todos. Por isso o risco de “não saber”, de apenas deixar o Campo nos conduzir, sem que tenhamos controle, até o alívio.

[iii] A verdade na constelação é uma revelação que surge e desaparece. A vivência dela transforma a todos.


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